O filme A Cabana ressuscitou uma discussão entre líderes
cristãos que foi muito intensa entre os anos de 2007, quando o livro homônimo
foi lançado, e 2009, quando essa obra literária se consolidou como best seller
mundial.
Um teólogo batista, professor no Seminário George W. Truett,
da Baylor University, no Texas (EUA), publicou um artigo no portal Patheos,
comentando as críticas feitas à mensagem que tanto o filme quanto o livro
transmitem.
Roger E. Olson considera os questionamentos ao filme e livro
“superficiais”, por se apegarem aos pormenores que geram debates teológicos,
como por exemplo, o fato de Deus ser represetado como uma mulher negra.
“Posso apenas dizer que estou muito desapontado com as
respostas dos cristãos evangélicos ao livro e ao filme. Em minha opinião,
alguns são extremamente superficiais e desdenhosos”, comentou o teólogo.
“Não precisamos concordar com todos os pontos da mensagem,
mas acredito que é sempre importante, especialmente para os cristãos, ter
discernimento bíblico ao ler qualquer livro ou assistir a qualquer filme”,
enfatizou.
Esse artigo vem sendo interpretado, internacionalmente, como
uma resposta ao presidente do Seminário Teológico Batista do Sul, Albert Mohler
Jr., que critica A Cabana por causa da representação de Deus, dizendo que “a
Bíblia adverte contra qualquer representação falsa de Deus e chama isso de
idolatria”.
Já o ponto de vista de Jerry Newcombe vai em uma terceira
possibilidade, que se harmoniza com a opinião de Mohler Jr., pois ele frisa que
a estória escrita por William P. Young “trata com muita liberdade a Pessoa de
Deus”, o que, eventualmente, poderia causar confusão nos cristãos.
De forma flexível, segundo informações do portal The
Christian Post, Newcombe aconselha aos cristãos que lerem o livro ou forem ao
cinema assistir o filme, que é importante discernir que trata-se de
entretenimento, e não ensinamento bíblico.
+ Jesus veio trazer o conceito do relacionamento, diz autor
de A Cabana
Um quarto ponto de vista foi abordado pelo teólogo Steven D.
Greydanus, que segue a direção da opinião de Olson: “A Cabana não diz que Deus
é realmente assim, mas que escolheu manifestar-se dessa maneira ao personagem
Mack Philips, interpretado no filme por Sam Worthington. Bem, quem pode dizer
que Deus não pode aparecer assim para alguém? Nenhuma interpretação imaginativa
de Deus é mais do que uma meia-verdade”, argumenta.
Debate no Brasil
O mesmo debate que hoje esquenta as rodas de discussão
teológica mundo afora por causa do filme, se instalou no Brasil anos atrás,
quando o livro foi lançado e se tornou um sucesso de vendas.
Em 27 de abril de 2009, a Igreja Batista de Água Branca
(IBAB) promoveu um debate moderado pelo pastor Ed René Kivitz, com a participação
de Ariovaldo Ramos e Ricardo Quadros Gouvêia, professor de filosofia da
Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Ariovaldo Ramos – que à época não se prestava à militância
política esquerdista, mas ao ensino das Escrituras – disse que o livro oferecia
um vislumbre de questões que atormentam a humanidade e que, como literatura,
poderia oferecer ao leitor um caminho para a compreensão do perdão.
“Não pode ser tratado como teologia. Em seu livro, William
P. Young foi corajoso por chegar na questão: ‘Onde estava Deus quando eu estava
sofrendo?’, tenta falar de um problema complexo do qual a humanidade se
identifica. Aborda o sofrimento, doutrina da trindade, perdão e a respeito
daquilo que nos aproxima ou afasta de Deus”, descreveu Ramos.
“O autor não escreveu o livro com grandes pretensões, porém,
uma das ideias do livro é: ‘Viver é sofrer, e todo o juízo de Deus passa pelo
sofrimento’. As pessoas anseiam pelo Deus descrito no livro. E aos que
apresentam Deus; tais como pastores, líderes e etc; talvez não o façam como
deveria ser, de acordo com o vício religioso de adorar aquilo que temos medo ou
pavor, porém, o autor mostra que pessoas podem adorar aquilo que amam e amar
aquilo que adoram. Cito um amigo, Machado: ‘Teologia é uma arte e não uma
ciência'”, acrescentou.
Já Quadros Gouvêia enfatiza que o livro ajuda entender que o
Evangelho não oferece uma resposta para o sofrimento, e sim, que há apoio
divino para a superação das dificuldades inerentes à vida.
“O problema do sofrimento humano não tem solução. O
Evangelho não é como as outras [religiões], não tem por obrigação resolver o
problema humano. O Evangelho não é uma religião e sim o substituto, o contrário
da religião. O autor mostra um Deus que sofre conosco, por nós e abraça a
condição humana. Por isso, quem somos nós diante de Deus para não sofrer?
Devemos reconhecer que o sofrimento faz parte da humanidade”, explicou.
“No livro o autor entende que o sofrimento é consequência da
maldade humana a partir da queda. O sofrimento humano levou Deus ao sofrimento.
Deus sofre em Cristo. A independência é fruto da possibilidade do ser humano em
decidir, e decidem errado. No livro, quando Deus é questionado em relação ao
que faria a respeito do sofrimento humano, a resposta é que Deus já fez através
de Cristo na cruz. Os seres humanos atraíram o sofrimento”, ponderou Ariovaldo
Ramos.
Sobre a abordagem feita pelo escritor a respeito da
soberania de Deus e sua postura diante da consequência do pecado, Quadros
Gouvêia disse considerar o livro “bastante conservador”, trazendo uma
representação prática do conceito do pecado.
“[A Cabana] fala da soberania divina e do pecado original,
retrata a Trindade. Estamos no século 21, na pós-modernidade, o pecado não é
uma ideia ou um conceito teológico, e sim uma realidade. Ter fé em Deus não
implica no abandono da insegurança. Corremos o risco de não nos indignarmos
suficientemente com a maldade”, observou, fazendo menção a um trecho do livro,
que diz que “a fé não cresce na casa da certeza”.
Ao final do debate, Ariovaldo Ramos resumiu de que se trata
o livro: “O grande anseio da humanidade hoje é o de ser amado, essa é a
proposta do autor”.
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